♦ Todo carisma se dá na confluência de pelo menos três elementos entre si diversos, mas em afinidade: Deus e sua gratuidade, o ser humano e sua sensibilidade, o tempo e suas vicissitudes. Deus é a fonte dos carismas e os distribui a quem, quando e como lhe aprouver. Não há que merecê-los. São gratuitos. Deus respeita a sensibilidade humana que pode acolher ou recusar a graça. Ao longo do caminhar da Igreja, o Espírito irrompe em diferentes tempos e lugares. Ele tem seus desígnios que desconhecemos. Sabemos que acontecem primaveras inesperadas. Nesse caminhar é que afloram os carismas.
♦ O carisma é graça, dom, manifestação do Espírito em pessoas escolhidas, habilitando-as a iniciativas novas e especiais seja na linha do serviço, da testemunho, da profecia, da misericórdia, da evangelização. Visa mais ao bem dos outros do que ao próprio. O Espírito Santo provê a Igreja de pessoas carismáticas que possam responder criativa e evangelicamente às urgências dos tempos e lugares, de modo particular o que se convencionou de designar de sinais dos tempos. O carisma conta sempre com a participação da pessoa: sensibilidade, acolhida, docilidade, compromisso das pessoas a quem é concedido.
♦ O carisma fundacional de uma família religiosa, como é o caso da Família Franciscana, resulta de uma experiência do Espírito que se torna a experiência fundante e que, em seguida passa aos discípulos e discípulas para ser vivida, custodiada e desenvolvida em favor do povo de Deus e da construção do Reino. Claro que, nos fundadores e fundadoras há uma especificidade própria e exclusiva. O carisma transmitido não é camisa de força, que deva ser repetido de forma inflexível. Trata-se de criar no presente uma história parecida com as origens. Fala-se muito em fidelidade criativa.
♦ Quando Francisco, naquele certo dia, encontrou-se com o Evangelho, este lhe soou como uma revelação e um convite: a exemplo de Jesus Cristo, tornar-se pequeno, menor, despojado de poder e riqueza e ir pelo mundo anunciando o Reino de Deus e a conversão. Francisco e Clara desencadearam um movimento evangélico-penitencial que, em boa parte, correspondia aos anseios do tempo.
♦ As fontes testemunham que ao ouvir o referido texto do Evangelho, Francisco teria dito, segundo a versão de Celano: É isto que eu quero, isto que procuro, é isto que desejo fazer de todo o coração. É como se Francisco descobrisse aquilo que sempre procurava na penumbra de suas inquietações. O Evangelho não lhe é estranho, ao contrário, corresponde às suas aspirações, como se fossem respostas às suas buscas. Desde a época em que vivera como prisioneiro vivia decepcionado com sistema fundado na servidão e nas relações de vassalagem. Sonhava com outras formas de convivência. Tudo isso constitui o chão onde ele ouve a voz do Evangelho.
Fonte: “Rever o sonho de Francisco e Clara de Assis no chão da América Latina e do Caribe”, Doc. CEFEPAL
Mesmo traços essenciais
A experiência franciscana primitiva muito nos fascina. A fraternidade que Francisco criaria hoje, certamente, não seria a mesma suscitada no século XIII. Mas teria os mesmos traços essenciais: comunhão de vida com os mais humildes, recusa do domínio exercido pelo dinheiro, busca de uma comunidade humana verdadeiramente fraterna, sentido e gosto pela pessoa concreta, acolhimento e respeito pela natureza, tudo isto vivido numa compreensão viva e tocante da humanidade de Deus.
Éloi Leclerc. “O retorno ao Evangelho”, Vozes, p. 127.
Fonte: Franciscanos – Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil (OFM)