Frei Rogério Viterbo de Sousa, OFM
Num destes dias, enquanto rezava devotamente o Santo Terço, fui tomado de saudades e meus pensamentos se voltaram ao tempo da infância. Lembrei-me que minha mamãe, todos os dias, convidava a mim e aos meus irmãos para rezar o Santo Terço. Era um momento sempre esperado de poder rezar à Santíssima Virgem Maria. Não me lembro de um dia de desespero e de tristeza em nosso lar, embora tivéssemos que enfrentar os problemas e as dificuldades que uma família simples tinha que enfrentar. O Santo Terço diário foi sempre a nossa força, e uma maneira de vivermos a nossa fé, sendo uma família sempre unida. Mamãe dizia-nos que, nas aparições, tanto em Fátima como em Lourdes, a Santíssima Virgem Maria pediu insistentemente para rezar o Santo Terço sempre. Contava ainda que, em sua aparição em Fátima, ela disse aos pastorzinhos que “não há problema de ordem pessoal, familiar, nacional e internacional que o Santo Terço não possa ajudar a resolver”.
O amor à Santíssima Virgem Maria sempre ia crescendo em minha vida, à medida que eu rezava piamente o Santo Terço. Quando me tornei, pela graça de Deus, um frade franciscano, aprendi, na vivência da espiritualidade franciscana, o amor que nosso Seráfico Pai São Francisco de Assis tinha pela Santíssima Virgem Maria e isto me encantou ainda mais.
Estudando a respeito da vida espiritual de São Francisco de Assis, aprendi que ela foi profundamente marcada pela devoção à Santíssima Virgem Maria, bem como a sua missão especial junto aos pobres, leprosos e necessitados. Consequentemente, aprendi também que a sua devoção mariana influenciou profundamente a Ordem dos Frades Menores e que ele constituiu a Santíssima Virgem Maria como “Advogada da Ordem”1 e sob a sua proteção colocou-a, confiando à sua maternal assistência os seus filhos espirituais até o fim.
Não pretendo agora escrever um tratado sobre a Mariologia Franciscana, mas sei que a maternidade divina é o ponto fundamental do pensamento mariano do Seráfico Pai São Francisco de Assis. Sei que Ele muito e sempre amou e venerou a Santíssima Virgem Maria, porque ela nos deu Jesus, o Filho de Deus. Ele viu, na dignidade de Mãe de Deus, o coração do mistério de Maria, tanto o fundamental como o central da sua grandeza.
Segundo o Seráfico Pai São Francisco de Assis, em primeiro lugar, a Santíssima Virgem Maria é gloriosa, pois Deus quis escolhê-la como Mãe de Deus! Tomado de grande piedade, um dia assim a Deus rezou: “Onipotente, santíssimo, altíssimo e sumo Deus,… fizeste que ele, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, nascesse da gloriosa sempre Virgem beatíssima Santa Maria”2.
Diz ele na Segunda Carta a todos os fiéis: “Esta Palavra do Pai foi tão digna, tão santa e tão gloriosa, o altíssimo Pai a enviou do céu por meio de seu santo anjo Gabriel ao útero da santa e gloriosa Virgem Maria, de cujo útero recebeu a verdadeira carne da nossa humanidade e fragilidade. Ele, sendo rico (2Cor 8,9) acima de todas as coisas, quis neste mundo, com a beatíssima Virgem, sua Mãe, escolher a pobreza”3. A maternidade divina da Santíssima Virgem Maria é para ele um motivo sempre especial para dar graças a Deus, para ser-lhe grato por ter descido ao nível do homem e para louvar e honrar a Santíssima Virgem Maria acima de toda outra criatura. Ele amava a Mãe do Senhor Jesus Cristo com um amor indizível, pois foi ela quem nos deu como irmão o Senhor Jesus Cristo e por ela obtivemos misericórdia, porque ela é a Mãe de Misericórdia.
Deste modo, olhando para o exemplo do Seráfico Pai São Francisco de Assis, e o seu indizível amor para com a Santíssima Virgem Maria, acredito, piedosamente, que a devoção mariana devesse fazer parte de nossa caminhada de fé e da nossa vida franciscana, tanto a nível pessoal, como no compromisso de fraternidade. Ele mesmo nos diz “Ordeno a todos os meus irmãos, quaisquer que sejam, aos atuais e aos vindouros, que a honrem e glorifiquem sempre, de todo jeito e de toda maneira que for possível, e de tê-la em muito grande devoção e veneração. Quero ainda que sejamos sempre seus fiéis servos”4. Se assim ele nos pede, como poderíamos deixar de atendê-lo? Qual poderia ser então a desculpa para não fazer assim? Creio que não existiria nenhuma desculpa que pudesse ser justa.
Estamos em pleno mês de Maio, mês chamado ternamente de Mês Mariano. A ideia de um mês dedicado especificamente à Santíssima Virgem Maria remonta aos tempos barrocos, no século XVII. Apesar de nem sempre ter sido celebrado em maio, o mês de Maria incluía trinta exercícios espirituais diários em homenagem à Mãe de Deus. Acredito ser este um momento todo especial, para meditarmos juntos com nosso Seráfico Pai São Francisco de Assis a majestade e a pobreza da Santíssima Virgem Maria. Quem sabe a reza humilde do Santo Terço ou a recitação da Coroa Franciscana das Sete Alegrias de Nossa Senhora nos ajudem a recuperar o gosto de rezar pedindo sempre a intercessão poderosa e contínua da Santíssima Virgem Maria, Mãe de Deus, Mãe da Igreja, Mãe nossa e Advogada de nossa Ordem Seráfica. Preparemos um lugar especial para colocar a imagem da Santíssima Virgem Maria, não por ser uma tradição comemorada há muitos anos na Igreja ou pelas graças especiais que se pode alcançar, mas porque Ela, sob o título de Nossa Senhora dos Anjos, é nossa Mãe, Mãe da Ordem dos Frades Menores e, sob o título de Nossa Senhora das Alegrias, é Mãe de nossa Custódia.
Sabemos e cremos que a Santíssima Virgem Maria se preocupa com todos os seus filhos e filhas, intercedendo sempre por nós. Por isso, merece nosso amor filial e também um mês inteiro para ser homenageada. E mais que isso, merece um lugar especial em nossas vidas e em nossos corações. Digo sempre que quem estiver perto da Santíssima Virgem Maria, sempre estará perto de nosso Senhor Jesus Cristo. Eu acredito, verdadeiramente, que assim seja.
Recordo um trecho de um livro que li no tempo do noviciado, que traduz a alegria por parte de nós, frades, com relação a bem viver com fervor nossa devoção mariana e que dizia: “Maria Santíssima, tão agraciada por Deus, possui encantos mil e, à semelhança do seu Filho Divino, é tão rica que um coração humano não pode venerar de uma só vez todas as prerrogativas de que foi cumulada pela generosidade divina. Há desta forma a possibilidade das mais variadas devoções da Virgem, há a possibilidade de cada qual venerá-la e amá-la sob o aspecto que mais o comove, que mais o inflama”5.
Concluo a feitura deste humilde texto mariano rezando, suplicando à Santíssima Virgem Maria que nos ajude a sermos mais parecidos com Nosso Senhor Jesus Cristo, seu Filho bendito, e nos transforme de “servos infiéis em fiéis servos de Deus”6. Quero ainda saudá-la usando as palavras do Seráfico Pai São Francisco de Assis dizendo simplesmente: “Ó Maria, Virgem Santíssima, não há outra semelhante, nascida neste mundo, entre as mulheres; filha e serva do Rei altíssimo, o Pai celeste; Mãe de Jesus Cristo Nosso Senhor; esposa do Espírito Santo: roga por nós, com São Miguel Arcanjo e com todas as virtudes dos céus e com todos os santos, junto a teu santíssimo e dileto Filho, Senhor e Mestre”7.
Desejo que minhas humildes palavras, talvez, lhes sirvam para um bom momento de reflexão. Se assim for,
Boa reflexão, então!
Convento São Francisco, Campo Grande, MS, 05 de abril de 2020.