Frente ao sofrimento provocado pela fome, pela violência, pela corrupção, pela desigualdade social e, atualmente, pela pandemia do coronavírus, podemos constatar a presença de uma outra pandemia chamada de “indiferença globalizada”.
Não tenho dúvida nenhuma de que a indiferença é resultado do individualismo, fundamentado num crescente egoísmo. Ninguém se sente responsável por mais nada. Ninguém tem culpa de nada. A desigualdade social, a miséria, a injustiça, a exploração e a destruição da natureza parecem hoje em dia não provocar nenhum tipo de dor na nossa entorpecida consciência. Afinal, parece que já estamos tão acostumados a nos eximir, dizendo apenas “Não tenho nada a ver com isso!” Aprendi, desde tenra idade, que, quando não existe culpado, todos somos culpados.
O individualismo vem tomando proporções cada vez maiores. Reina na nossa sociedade um egoísmo que motiva à intolerância e ao desrespeito. Afinal de contas, o que importa é que eu seja o centro do universo e das atenções! Tudo tem que ser do jeito que eu penso, do jeito que eu quero e do jeito que eu gosto que seja sempre!
Hoje, parece, que somos levados a pensar somente em nós mesmos, nas nossas metas, nos nossos interesses e ponto final! Já não nos importa o que vai acontecer com as outras pessoas, o que importa é o nosso bem-estar, é poder lucrar, é acumular e alcançar os nossos próprios objetivos. Não podemos negar que o individualismo, infelizmente, já faz parte, em todos os aspectos, da nossa vida, nestes tempos de modernidade, e tem se tornado um grande mal para a humanidade.
Vejo forte influência para a indiferença ser provocada pelo mau uso das novas tecnologias, mudanças para pior no comportamento causadas pela dependência dos smartphones e das redes sociais. Não podemos negar, quantas surpresas e decepções se materializam também neste espaço do mundo virtual! Os laços de promoção da vida, construídos pela graça do encontro e da presença real são desfeitos num átimo de tempo.
É um contexto complexo, eu sei, e com mudanças instantâneas, onde tudo ocorre velozmente e a um curtíssimo prazo. O triste é constatar que, prisioneiros do individualismo e praticantes da indiferença, vamos nos tornando mestres em conectar nossa vida com as superficialidades e desconectá-la dos valores, daquilo que realmente somos, da nossa fé, da nossa essência e da nossa origem.
Alerta-nos o Santo Padre, o Papa Francisco: “A primeira forma de indiferença na sociedade humana é a indiferença para com Deus, da qual deriva também a indiferença para com o próximo e a criação. Trata-se de um dos graves efeitos dum falso humanismo e do materialismo prático, combinados com um pensamento relativista e niilista. O homem pensa que é o autor de si mesmo, da sua vida e da sociedade; sente-se autossuficiente e visa não só ocupar o lugar de Deus, mas prescindir completamente d’Ele; consequentemente, pensa que não deve nada a ninguém, exceto a si mesmo, e pretende ter apenas direitos”1.
Creio que, para não permitir o crescimento da globalização da indiferença e sua consolidação, é urgente criar uma cultura de solidariedade e de misericórdia, alicerçada no amor incondicional. Isto começa no nosso coração. Ou seja, na maneira como amamos e servimos os nossos semelhantes, no jeito que preservamos a vida e a natureza, no uso crítico dos meios de comunicação, na disponibilidade para atender os mais necessitados e sofredores, na pureza do olhar, no compromisso com a justiça e a verdade e no jeito sempre terno de fazer a vida ser preservada, apesar do ruim que acontece.
Desejo que minhas humildes palavras, talvez, lhes sirvam para um bom momento de reflexão. Se assim for,
Boa reflexão, então!
Convento São Francisco, Campo Grande, MS, 14 de abril de 2021.