Frei Rogério Viterbo de Sousa, OFM
A tentação está sempre presente na nossa história pessoal. Ela é uma provocação do desejo para algo que nos parece bom, mas depois descobrimos que não e, iludidos, caímos num engano, com consequências, por vezes, graves e negativas para nossa vida. Estamos todos sujeitos a ela a todo momento. Ninguém pode dizer que não enfrenta nenhum tipo de tentação, pois ela, infelizmente, faz parte da natureza humana. “Não vos sobreveio tentação que não fosse humana”1. “Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia”2. Aprendemos, pelo ensinamento da Santa Igreja, que a tentação existe e é um problema provocado por nós mesmos e não por Deus. Aprendemos, também, que podemos arruinar a nossa vida se sucumbirmos frente a ela e, por causa disso, nos desviarmos do caminho certo que leva para Nosso Senhor Jesus Cristo.
Recentemente estive ouvindo uma meditação do Santo Padre, o Papa Francisco, onde ele dizia: “Na debilidade das tentações, que mais cedo ou mais tarde todos temos
— é suficiente pensar na tragédia da corrupção que começa sempre com as pequenas cedências —, não se deve cometer a ingenuidade de se enredar no diálogo: ao contrário, é preciso ter a coragem da oração e de pedir perdão para se reerguer e ir em frente, com a certeza de que a graça nos ajuda a não nos escondermos do Senhor”3. Chamaram a minha atenção, nesta sua fala, dois pontos: as “pequenas cedências” às tentações e o “não nos escondermos de Deus”.
Então, como se dariam as nossas pequenas cedências? Penso que se dariam quando consentimos deliberadamente as tentações em nosso coração, mesmo sem ter cometido um ato pecaminoso. Quando consideramos os prazeres e supostos benefícios de ceder a elas e assim vamos permitindo que elas se instalem em nossa mente e se transformem em atitudes. Não podemos criar espaços e oportunidades para que nenhum tipo ou forma de tentação encontre lugar no nosso coração e na nossa vida. Não podemos permitir nenhum tipo de cedência. É necessário que tenhamos uma atitude constante e perseverante de vigilância dos nossos olhos, ouvidos, pensamentos e atitudes. É de pequenas cedências que podemos nos tornar grandes perdedores na luta contra a tentação. Seria uma triste realidade, se assim fosse.
Com relação ao segundo ponto: como poderíamos não nos esconder de Deus? Quando pecamos, também ficamos envergonhados e com medo. Surge então, em nossa mente, uma grande tentação para que, nestes momentos, nos escondamos. Sabemos que não há como se esconder de Deus. “E não há criatura que não seja manifesta na sua presença; pelo contrário, todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos daquele a quem temos de prestar contas”4. Quem decide se esconder de Deus fica sem uma verdadeira proteção sobre a sua vida, pois não existe maior proteção do que a que Deus nos oferece. Na nossa luta contra qualquer tipo de tentação, precisamos ser encontrados por Deus e amparados pelo seu socorro. O Santo Padre, o Papa Francisco, nos lembra de que, na nossa constante luta contra a tentação, principalmente nesta tentação de nos escondermos de Deus, precisamos sempre rezar: “Se reza: Ajuda-me, Senhor, sou fraco. Não quero me esconder de você. Isso é coragem, isso é vencer. Que o Senhor nos dê a graça e nos sustente nesta coragem e se formos enganados pela nossa fraqueza na tentação, que Ele nos dê a coragem de nos levantar e seguir em frente. Jesus veio para isso”5. Quando compreendemos o amor de Deus, jamais buscaremos nos esconder d’Ele.
No nosso processo de viver nossa vocação à vida e à santidade, temos imensa necessidade da orientação de Deus, especialmente nas decisões importantes que temos que tomar. “Não cabe ao homem determinar o seu caminho”6. Precisamos olhar para Deus, para que nos mostre o caminho que devemos seguir. O escritor Gilbert Keith Chesterton disse: “Quem não acredita em Deus, passa a acreditar em qualquer coisa”. Nós escolhemos acreditar em Deus.
Nestes tempos conturbados que estamos vivendo, penso que a grande tentação é e sempre será a recusa de Deus, de seu amor, de sua justiça, de seu Reino de paz, de alegria e de vida plena para todos. Quando nos fechamos à prática constante da fraternidade e da solidariedade no mundo, estamos fechando as portas ao Reino de Deus presente no meio de nós. Diante de qualquer tipo de tentação, não podemos pretender enfrentá-la sozinhos. Deus cuida de nós, desde que acolhamos o dom da sua graça e correspondamos a Ele.
Não podemos nos esquecer de que “Nos momentos mais difíceis da nossa vida, nos momentos mais sofridos, nos momentos de agonia profunda, Deus vigia conosco, Deus luta conosco, está ao nosso lado. Por quê? Porque é Pai. Assim começamos a oração: “Pai Nosso”. E um pai não abandona seus filhos. Aquela noite de dor de Jesus, de luta, é a última marca da encarnação: Deus desce, vem nos encontrar nos nossos abismos e nas dificuldades que marcam nossa história”7.
A luta contra a tentação é grande e interminável aqui na terra. Ninguém nunca disse que tal luta seria fácil. Nosso Senhor Jesus Cristo nos diz que existem dois caminhos a seguir: um que leva à vida; outro que leva à morte. O caminho da vida é o da porta estreita e é difícil de entrar (cf. Mt 7,13-14); para o trilharmos, temos que estar dispostos a negar a nós mesmos (cf. Mt 16,24). Essa é uma maneira certa, através da qual podemos vencer a tentação.
Precisamos voltar nossos olhos e corações para Nosso Senhor Jesus Cristo. No seu exemplo de luta contra o mal, Ele nos ensina como podemos sair vitoriosos na luta contra a tentação. Ele vence todas as tentações com a Palavra de Deus, sem nunca se afastar de Deus, se mantendo sempre fiel à vontade de Deus e sem nunca procurar nenhum tipo de satisfação pessoal, de poder e de aplausos.
Nosso Senhor Jesus Cristo preveniu e recomendou aos seus discípulos a vigilância e a oração para não caírem em tentação. Nós vencê-la-emos, portanto, com uma constante vigilância, com a escuta atenta da Palavra de Deus, com a contínua oração pessoal e comunitária, com a renúncia de nossas vontades e vaidades e com a prática do amor ao próximo, sobretudo aos mais necessitados e sofredores. É esta a pedagogia que a Santa Igreja, olhando para nosso Senhor Jesus Cristo, nos convida a observar sempre e, de modo singular, nesta nossa caminhada quaresmal.
Por isso, imploremos a Deus que nos socorra com a sua graça, de maneira que mantenha viva e fortificada em nós a força interior da resistência e da superação para não sucumbirmos jamais. A nossa prece deve ser urgente, constante, confiante e serena, porque Deus é fiel e não permitirá que sejamos tentados além das nossas forças. Pelo contrário, junto com a provação ele providenciará o bom êxito, para que possamos suportá-la e vencê-la (cf. 1Cor 10,13).
Sejamos perseverantes na oração feita com fé maior, não porque Deus não nos escuta, mas porque nós precisamos de tempo para poder assimilar a sua santíssima vontade e o que de fato precisamos pedir para o bem de nossa vida. Deus nos ama e, porque nos ama, nos socorre sempre, Ele é o Pai bondoso que aos seus filhos e filhas concede, através do amor infinito e eterno, a salvação.
Portanto, evitemos qualquer tipo de tentação. Fujamos das ocasiões perigosas. Peçamos a Deus “não nos deixeis cair em tentação” e a Maria Santíssima, Senhora das Alegrias, que nos proteja do mal.
Desejo que minhas humildes palavras, talvez, lhes sirvam para um bom momento de reflexão. Se assim for,
Boa reflexão, então!
Convento São Francisco, Campo Grande, MS, 24 de fevereiro de 2021.