Frei Rogério Viterbo de Sousa, OFM
“Fui eliminando muitas coisas inúteis de minha vida e Deus se aproximou para ver o que estava acontecendo”. (Christian Bobin)
Confesso que tenho procurado viver eliminando coisas inúteis da minha vida e que Deus tem me conduzido pelo caminho da verdadeira simplicidade, como costumo dizer: da simplicidade franciscana. Partindo desta minha experiência, quero refletir de forma muito singela a importância da retomada da simplicidade na nossa vida franciscana.
Estamos perdendo a capacidade de gostar das coisas simples e de viver com simplicidade. Parece-me que a simplicidade está sendo esquecida e abandonada por nós. Já não queremos torná-la uma realidade constante em nossas atitudes e uma marca fundamental de nossa forma de viver franciscanamente.
Estou convencido de que a simplicidade franciscana seja exatamente a arte de olhar a vida, o mundo e as pessoas a partir da vivência radical da nossa minoridade. Vamos nos tornando pessoas complexas demais quando queremos interpretar a vida de acordo com os nossos quereres. A simplicidade nos capacita para perceber que tudo precisa ser bem simples para trazer verdadeira felicidade. Queremos muitas coisas o tempo todo, e então nos perdemos na armadilha dos nossos próprios desejos, por vezes equivocados. Para quem quer demais, existe um risco de que não consiga ficar com nada, de que venha a perder tudo ou quase tudo.
A simplicidade torna possível para nós a descoberta do que é essencial. Vivemos, por escolha própria, em meio ao amontoado de coisas e realidades supérfluas que vão tornando a nossa vida sem graça e muito pesada. Tudo isso porque abandonamos a arte de viver com simplicidade.
Recentemente, estive lendo um texto de André Comte-Sponville, que é um grande filósofo materialista francês, onde ele dizia: “O simples vive como respira, sem maiores esforços nem glória, sem maiores efeitos nem vergonha. A simplicidade não é uma virtude que se some à existência. É a própria existência, enquanto nada a ela se soma. Por isso é a mais leve das virtudes, a mais transparente e a mais rara. É o contrário da literatura: é a vida sem frases e sem mentiras, sem exagero, sem grandiloquência. É a vida insignificante, a verdadeira vida (…)” (“Pequeno tratado das grandes virtudes” – ensaio, 1995, p. 163-171).
Meditando este texto, cheguei à conclusão de que precisamos aprender que a simplicidade evita desgastes inúteis e tem o poder de apresentar as coisas em suas reais proporções, sem ilusórias ampliações ou reduções; que é preciso que recordemos que a simplicidade é uma característica inequívoca da vida cristã e da nossa forma de vida franciscana, que se exprime através da incondicional confiança em Deus e da sua Divina Providência. Creio que, somente movidos de total simplicidade, aprenderemos a praticar com toda coragem o desapego e a partilha do que somos e do que temos.
O Seráfico Pai São Francisco de Assis, a simplicidade em forma de gente, nos ensinou que Deus se revela na simplicidade, na humildade, na pobreza e na pequenez, que veio ao encontro da humanidade na pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo, anunciado pelos Profetas e esperado pelo Povo de Deus. Paradoxalmente, Deus não Se revela no orgulho e na prepotência. Ele vem como um Rei pobre, com humildade e com toda simplicidade.
Portanto, podemos intuir que a nossa simplicidade franciscana pode levar-nos sempre de novo a valorizar as dimensões da nossa verdade interior, que só Deus conhece, e não a aparência vistosa dos critérios tão apreciados neste mundo. Precisamos querer novamente que o nosso coração franciscano seja simples, humilde e puro; que ele esteja repleto da virtude da simplicidade demonstrada incansavelmente em nossas atitudes a cada dia.
São Lourenço Justiniano afirma: “O Reino de Deus está dentro de nós e, portanto, é dentro do coração que Deus quer morar”. Que Deus encontre o nosso coração franciscano transbordando de muito amor e com toda simplicidade.
Busquemos, comecemos, portanto, a viver a simplicidade em todos os nossos atos, naquilo que pensamos, que fazemos, que somos e que queremos. E, se isso acontecer, certamente a vida será bem mais bonita e leve de ser vivida. Descobriremos Deus nas coisas mais simples desta vida. Como diz o filósofo André Comte-Sponville: “Tudo é simples para Deus; tudo é divino para os simples”. Que tudo seja divino para nós, porque aprendemos a viver simplicissimamente a vida com toda a simplicidade.
Desejo que minhas humildes palavras, talvez, lhes sirvam para um bom momento de reflexão. Se assim for,
Boa reflexão, então!
Convento São Francisco, Campo Grande, MS, 13 de setembro de 2021.