Em meio ao tempo de recolhimento, silêncio e penitência que marcam o itinerário
quaresmal, eis que surge, como um oásis no deserto, a celebração do glorioso São José, esposo da
Virgem Maria, pai nutrício de Nosso Senhor Jesus Cristo e patrono da Igreja Católica. Este homem
santo, guardião da Sagrada Família de Nazaré, é para nós, católicos, um patrocínio seguro, um
refúgio certo e um modelo de santidade. Além disso, neste momento em que me encontro em tempo
de missão franciscana, em uma fraternidade formativa de acolhida aos jovens que almejam entrar na
vida franciscana, acrescento que São José é também um precioso modelo e exemplo para nós, que
seguimos as sendas do itinerário da formação franciscana, inicial e permanente.
Uma das passagens que marcam a identidade franciscana, em sua escolha pela pobreza e
minoridade, é a passagem do Evangelho de São Mateus, capítulo 25, versículos 31 a 46, na qual o
autor sagrado descreve o Juízo Final, quando Cristo, em sua glória, dirá àqueles que fizeram o bem
nesta terra: “Vinde, benditos de meu Pai! Recebei como herança o Reino que meu Pai vos preparou
desde a criação do mundo! […] Todas as vezes que fizestes isso a um dos menores dos meus irmãos,
foi a mim que o fizestes!” (Mt 25, 34; 40). Esta passagem, modelo para todos os que querem seguir
Cristo, pobre, humilde, crucificado e ressuscitado por amor de nós, é uma excelente chave de leitura
para nos ajudar a compreender por que São José é um precioso modelo para a nossa formação cristã
e franciscana.
José, o justíssimo, encarna e atualiza o Evangelho de São Mateus, conhecido como o
Evangelho da justiça. Assumindo o seu serviço de guardião de Jesus e Maria, o Santo Patriarca de
Nazaré faz ecoar em sua vida este “foi a mim que o fizestes” do Evangelho e, assim, nos aponta o
caminho a seguir. Não há muitos relatos da atividade de José, mas, observando o pouco que a
Escritura nos apresenta, percebemos que ele é bendito, pois, no próprio Cristo, ele alimentou o
faminto, deu de beber ao sedento, recebeu o estrangeiro, vestiu o nu, cuidou do doente e visitou o
preso. E, por sua vez, foi também faminto, sedento, estrangeiro, nu, doente e prisioneiro.
“Eu estava com fome e me destes de comer; eu estava com sede e me destes de beber.”
José, justo que era, nutria com seu trabalho árduo e humilde a Família de Nazaré. Além
disso, ele, judeu que era, também tinha fome e sede de justiça, de paz e de amor, e esperava pelo
novo Reino que havia de chegar. E teve a graça de segurar a esperança nos braços! Assim como
José, todo franciscano e toda franciscana são convidados a ter fome e sede do Reino de Deus e a
trabalhar incansavelmente para que ele aconteça em si mesmos, nos irmãos e em toda a terra, e para
que Cristo, que nos alimenta e é a nossa esperança, sacie todas as fomes do mundo, principalmente
daqueles que não têm pão material em suas mesas e lares.
“Eu era estrangeiro e me recebestes em casa.”
José, atento à Palavra de Deus e com os ouvidos sempre prontos a escutar, soube acolher
com diligência esta mensagem estranha, este plano de salvação quase incompreensível à nossa
humanidade, estas surpresas de um Deus que falava com ele em sonho. Ele mesmo, com Maria, sua
esposa, foi estrangeiro em Belém, tendo de se alojar em uma pobre estrebaria, pois não houve
hospedaria que lhe abrisse as portas. Foi também estrangeiro na terra do Egito, para onde foi com
Maria e o Divino Menino, fugindo da fúria de Herodes. Em espírito de fidelidade, minoridade e
comunhão universal, todo franciscano e toda franciscana são convidados a, assim como José,
escutar atentamente a Deus que nos fala, ser fiéis à sua vontade e acolher as suas surpresas. O
coração do franciscano deve ter pressa na acolhida, deixando de lado a estranheza que o outro lhe
desperta, a estrangeiridade do ser do outro em sua mais profunda subjetividade, e todo tipo de
repulsa e preconceito, para acolher a mais bela imagem de Cristo que o outro tem para nos revelar.
“Eu estava nu e me vestistes”
Os Evangelhos, ao relatar que José e Maria colocaram o Menino de Belém em uma
manjedoura, envolvendo-o em faixas, nos dão um sinal do cuidado amoroso de São José, que, com
certeza, deve ter ajudado Maria muitas vezes no cuidado do Divino Menino e em sua educação,
que, aos poucos, o iam vestindo de personalidade e caráter. Para nós, José ensina que vestir o nu é,
como Francisco, ir até os leprosos de nosso tempo. Ir ao encontro daqueles que parecem não ter
nada a nos oferecer, ir ao encontro da nudez e da humanidade mais escandalosa de nossos irmãos e
irmãs, aproximar-se daqueles que se perderam em uma vida vazia de sentido ou que foram
esvaziados de sua dignidade humana, fazendo-se um com eles, oferecendo as vestes da acolhida, do
cuidado, do amor desinteressado, do perdão e do retorno à humanidade perdida. Todo franciscano é
chamado a unir-se a Cristo, que, nu no patíbulo da cruz, uniu-se às nudezas de nossa humanidade e
a revestiu de plenitude e graça por sua ressurreição.
“Eu estava doente e cuidastes de mim”
A Igreja confiou ao patrocínio de São José os doentes e os moribundos, fiel à tradição
segundo a qual São José, na hora de sua última agonia, teve o socorro e o cuidado amoroso de Jesus
e de Maria, partindo envolto em amor e doce consolação. Esta cena da vida do glorioso São José
nos desafia a cuidar de todos, em suas feridas, enfermidades e situações de morte, levando-lhes
sempre o amor e o cuidado, a ternura e a paz. Diante de tantos homens e tantas mulheres que
sofrem, nós não devemos colocar o dedo na ferida, mas sim cuidar, enfaixar, aliviar a dor e curar as
enfermidades físicas, sociais e espirituais de nossos irmãos e irmãs. Além disso, diante de uma
natureza violentada, ferida e machucada, todo franciscano deve zelar pela casa comum,
comprometendo-se com ações que promovam a justiça, a paz e a integridade de toda a obra criada
por Deus. O franciscano e a franciscana são convidados a levar, nem que seja uma única e última
vez, a todos aqueles que encontrarem, o olhar terno e amoroso de Cristo, que cura, liberta, salva e
dá vida plena e abundante para todos.
“Eu estava na prisão e fostes me visitar”
São José foi prisioneiro somente do amor. Sendo fidelíssimo, mesmo quando pensou em
deixar Maria, o fez porque sabia das cadeias que prendiam a sociedade de sua época. Ele é, para
nós, modelo de alguém que nunca se sentiu preso a obrigações e meros preceitos. Ao contrário, na
liberdade do coração, soube doar a sua vida até o fim, abandonando e ressignificando sonhos e
projetos para abraçar, com coragem, a vontade do Pai. Francisco e Clara, assim como José,
souberam amar na liberdade, e nós, franciscanos e franciscanas, somos convidados a viver na
liberdade do amor, pobre e desapegado, que procura, a cada dia, abandonar manias, vontades
infundadas, orgulho, vaidade, certezas, pretensões de controle e todo tipo de posse que nos afasta de
Deus, dos irmãos e de nossa integridade e felicidade, para deixar-se conduzir por Deus e por sua
providência, unindo ao coração d’Ele nossos sonhos, desejos e projetos, certos de que Ele nos quer
livres e nos faz felizes. Além disso, todo franciscano e toda franciscana devem ser contrários a
autoritarismos, leis injustas e todo tipo de violência que tira do irmão, da irmã e de toda a criação a
possibilidade de viver e se desenvolver livremente. Todos devem ser livres para amar, para lutar,
para se relacionar, para viver sua religiosidade, espiritualidade, costumes e tradições, desde que
tudo esteja eticamente pautado no horizonte da partilha, do bem comum e do amor mútuo, pois, “foi
para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gl 5, 1). Deste modo, se nos amarmos uns aos outros,
vivendo em liberdade, partilha e comunhão, finalmente Deus será tudo em todos. Essa é a utopia e a
esperança que nos levam para o céu.
Que o glorioso São José, castíssimo esposo da Virgem Maria, patrono da Igreja e pai
nutrício do Salvador, possa interceder por nós em nossa formação inicial e permanente, para que
possamos, como cristãos e cristãs, franciscanos e franciscanas, ser cada vez mais integralmente
humanos, vivendo em fraternidade, minoridade e pobreza, nas estradas da vida rumo à santidade.
Que, nesta santa Quaresma, São José nos ajude a caminhar sempre em espírito de penitência,
conscientes de nossas vulnerabilidades e abertos à graça de Deus, que nos toma pela mão e nos
permite recomeçar sempre e de novo, com os olhos fixos em Jesus, espelho da perfeição, rumo ao
qual, como fraternidade integral, peregrinamos esperançosos de encontrar, a cada dia e de uma vez
por todas, a plenitude do amor que nos une, salva e plenifica.
fonte: Fr. Matheus Pereira Sanches, OFM