Missão Franciscana do MT e MS

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Mensagem do Custódio › 08/12/2020

Palavras de um coração franciscano – A oração pessoal e o silêncio

Quais são os ensinamentos de São Francisco de Assis?

A oração pessoal e o silêncio

Frei Rogério Viterbo de Sousa, OFM

 Um dia, durante o meu momento de oração, me pus a meditar sobre a importância da oração pessoal e do silêncio na minha vida de frade menor. Confesso que, neste dia, não rezei como de costume. Meus pensamentos não me permitiram rezar, pois buscavam palavras que pudessem explicar a importância e o porquê da oração pessoal e do silêncio necessário para este momento. Inquieto, saí da capela. Lembrei-me, então, que em nossa língua portuguesa temos dois vocábulos para definir a relação consciente e coloquial do ser humano com Deus: prece e oração. A palavra prece provém do verbo latino “precor”, que significa rogar, ir a alguém solicitando um benefício. O termo oração provém do substantivo latino “oratio”, que significa fala, discurso, linguagem.

Pensando nestas definições, fui sendo conduzido para chegar à compreensão, à importância e ao porquê da oração pessoal e da necessidade do silêncio para se rezar bem. Para mim, ambos se tornaram absolutamente necessários para alimentar a minha vida espiritual e a minha vocação franciscana. A oração pessoal é o ar, a respiração que permite que a vida espiritual se desenvolva. É com ela que posso atualizar a minha fé na presença de Deus e no seu amor infinito. Rezando sempre, sinto que cresce em mim a esperança que me leva a orientar a minha vida para Deus e a confiar a cada momento em sua Divina Providência. Sinto ainda que o meu coração franciscano fica feliz ao responder com o próprio amor ao Amor divino, que não se cansa de me amar. É claro que eu não poderia deixar de pensar na importância do silêncio para que conseguisse este êxito na minha oração pessoal.

Movido por estas verdades, pensei em escrever este texto, para apenas atentar para a importância da oração pessoal e do silêncio em nossa vida religiosa franciscana. Vivemos tempos difíceis, neste presente momento da história e, na sua agitação, é imprescindível saber parar e silenciar. Vive-se envolvido em barulho, corre-se de um lado para o outro nas mais diversas atividades. Muitas vezes ficamos dominados pelo stress, a ponto de se chegar a certo desequilíbrio psicológico que resulta em nervosismos, por vezes com atitudes desconcertantes.

É neste mundo de tantas perturbações, que se tornam urgentes os momentos de silêncio e com eles os momentos frutuosos de oração pessoal. Na vida cristã, há a oração litúrgica, como acontece, especialmente, em cada domingo, na Eucaristia; há também a oração comunitária, que se introduz na dinâmica de nossa vida fraterna; há ainda os momentos de oração pessoal. A oração pessoal se torna muito importante. Sem esta, todas as outras formas de oração não seriam completas. A oração pessoal é encontro, é diálogo, é experiência, é compromisso de fidelidade. Na oração pessoal, a relação é com o Deus que se reconhece Pai e muito próximo da nossa vida.

Todos nós bem sabemos que, para rezar bem, é necessário buscar o silêncio. Nesta nossa sociedade repleta de barulho, o silêncio é um imperativo indispensável para o nosso equilíbrio psicológico. A oração pessoal também precisa de momentos de silêncio. Longe do ruído, sem o barulho do rádio, da televisão, do telefone celular, no silêncio do quarto, da capela ou de um lugar tranquilo, é possível respirar o mistério de Deus. E como tudo isso faz um bem enorme para nossa vida! Programar este silêncio pode ser ponto de partida, não apenas para uma saúde espiritual, mas até para o nosso equilíbrio humano, indispensável ao nosso viver no tempo presente. Na oração pessoal acompanhada do verdadeiro silêncio, podemos sempre ter uma oportunidade única para conversar com Deus e, principalmente, para ouvir o que Ele tem a nos dizer. Se fizermos esta experiência diariamente, confirmaremos a importância da oração pessoal como um caminho de espiritualidade que nos torna bem mais felizes.

Eu sei, por experiência própria, que no processo de reavivar o diálogo com Deus, através da oração pessoal e do silêncio, surgem inúmeras barreiras. Uma das principais é exatamente o desejo tentador de fugir deste compromisso de rezar com fidelidade a cada dia, para ficar em nossa “zona de conforto” individual. Desta forma, a oração pessoal corre o risco de se esvaziar e se transformar, quando rezamos, em uma espécie de diálogo mascarado, em que fingimos falar  e escutar a Deus.

Para  que  isto  não  aconteça  em  nós,  devemos  lembrar-nos  do  que  o  Apóstolo Paulo diz: Não sabemos rezar como convém, mas o próprio Espírito Santo  reza  dentro  de  nós1.  Deixemos  o  Espírito  Santo  rezar  em  nós  e  o busquemos  pelo  caminho  do  verdadeiro  silêncio.  Acredito  que  nossa  oração pessoal será mais agradável ao coração de Deus.

Compreendo que, para muitos de nós, seja muito difícil fazer e permanecer em silêncio. Recentemente, li um livro de Thomas Merton e chamou muito a minha atenção o que ele dizia sobre o silêncio: “Quando me liberto pelo silêncio, quando não mais estou envolvido em calcular a vida, mas em vivê- la, posso descobrir uma forma de oração em que efetivamente não há   distrações.   Toda   a   minha   vida   se   torna   oração.   Todo   meu silêncio está repleto de oração. O mundo de silêncio em que me acho imerso contribui para minha oração”2. Que bom seria se em nós também pudesse existir sempre um mundo de silêncio. Certamente seríamos capazes de uma  oração  pessoal  mais  bem  rezada,  bem  vivida  e  sempre  transformada  em atitudes repletas de paz e confiança para seguirmos em frente.

Ainda pensando na importância do silêncio, recordei-me da experiência de oração pessoal de Santa Teresa de Calcutá. Lendo seus escritos, encontrei uma passagem onde ela pedia para ouvir o silêncio. Assim pedia esta santa de Deus àqueles que a escutavam: “Prestai atenção ao modo como escutais. Escuta em silêncio. Quando o teu coração transborda com um milhão de coisas, não consegues ouvir a voz de Deus. Mas, assim que te pões à escuta da voz de Deus no teu coração pacificado, ele enche-se de Deus. Isso requer muitos sacrifícios, mas se temos realmente o desejo de rezar, se queremos rezar, temos de dar este passo. Trata-se apenas do primeiro passo, mas se não o dermos com determinação, nunca alcançaremos a última etapa, a presença de Deus”3.

Sem muitas divagações e de forma bem resumida, quero ainda falar sobre a oração pessoal e sobre o silêncio na vida de Nosso Senhor Jesus Cristo. Todos nós sabemos e aprendemos sobre o seu jeito de rezar. Ele rezava sempre e gostava do silêncio para rezar. O Santo Evangelho apresenta muitas vezes Jesus em oração pessoal. Ele retirava-se para o silêncio e para a solidão, mesmo de noite. Jesus rezou antes dos momentos decisivos da sua missão ou da missão dos Apóstolos. De fato, toda a sua vida foi uma verdadeira oração, porque Ele vivia fielmente sua comunhão constante de amor com Deus Pai. Se Nosso Senhor Jesus Cristo tinha necessidade de rezar, de silêncio, mesmo sendo Deus, quanto mais necessidade temos nós, que somos os “servos inúteis”, deveríamos ter?! Pensemos nisso com amor e com humildade. Quem sabe, surgirá em nós um desejo maior de fazer da nossa oração pessoal e silenciosa um pouco mais semelhante à de Nosso Senhor Jesus Cristo e um caminho sempre aberto para chegarmos ao seu Sagrado Coração.

Não posso deixar de lembrar também do nosso Seráfico Pai São Francisco de Assis que, segundo Tomás de Celano, é a personificação da oração. Não era um orante, mas um homem transformado na própria oração. “Seguindo os

passos de São Francisco, que se transformou ‘não só o orante, mas na própria oração’ (2Cel 95), removendo todos os obstáculos, ‘os irmãos sirvam, amem, honrem e adorem o Senhor Deus de coração limpo e mente pura’, porquanto, é necessário orar sempre sem esmorecer, pois tais são os adoradores que o Pai procura4”. Como frades franciscanos, deveríamos também nós ser capazes de nos transformar naquilo que rezamos. É claro, se rezamos sempre com fé maior. Ouso pensar assim, obrigando-me a buscar fazer isto de fato acontecer, primeiramente na minha vida de frade menor.

Singelamente, vou concluindo estas humildes linhas sobre a oração pessoal e sobre o silêncio, afirmando que quem reza e cultiva o silêncio certamente pode ser e viver mais feliz. Rezar e silenciar costumam fazer bem e nos fazem ainda ter bonitas histórias de nossa experiência com Deus para partilhar com todas as pessoas. Não nos esqueçamos de que o nosso coração franciscano também foi feito para rezar e abrigar o silêncio que faz bem. Sendo assim, rezemos sempre e saibamos viver o silêncio. Façamos como nos exorta o Apóstolo Paulo: Orai sem cessar. Em todas as circunstâncias, dai graças, porque esta é a vosso respeito a vontade de Deus em Jesus Cristo5. E também o  profeta Habacuc: O Senhor, porém, está em seu santo templo; diante dele fique em silêncio toda a terra6.

Desejo que minhas humildes palavras, talvez, lhes sirvam para um bom momento de reflexão. Se assim for,

Boa reflexão, então!

Convento São Francisco, Campo Grande, MS, 07 de maio de 2020.

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