Missão Franciscana do MT e MS

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Artigos › 14/03/2021

São José, esposo da Virgem Maria

Pe. Johan Konings, SJ

A festa de São José toca cordas muito sensíveis do coração humano. Tem um aspecto de mistério, que, à primeira vista, parece ser um estar por fora, porém, no olhar da fé, revela ser um estar por dentro. O evangelho de Mt 1,18-25 ilustra isso muito bem. É construído sobre a estrutura do paradoxo que acabamos de apontar. Diante da constatação da gravidez de Maria, José reage, primeiro, conforme a lógica: sente-se por fora e, prudentemente, tira a conclusão: decide deixar Maria, em segredo, para que ela não fique exposta à perseguição. Porém, exatamente esta “justiça” no seu tratamento da questão mostra que ele está profundamente envolvido. Quando o anjo lhe explica que o fruto no útero de Maria é obra de Deus, sua justiça produz a fé, que o faz assumir este mistério como seu. Está envolvido muito mais do que a mera paternidade física poderia envolver.

Paternidade não é uma questão biológica, é uma questão de fé. Com este slogan se poderiam abordar diversos aspectos da mais candente atualidade. Filho, a gente tem não tanto gerando-o quanto assumindo-o, entregando-se a Deus como instrumento de seu projeto. Ou, em expressão popular: filhos, a gente não os faz; recebe-os. Recebe-os como um dom de Deus, na fé, e, por isso, por não serem um produto exclusivamente nosso, dedicamo-nos a eles mais ainda.

Com isso, chegamos a um segundo tema: a responsabilidade. São José aparece como o homem responsável, fiel e prudente, a quem Deus confiou seu Filho. Nós temos o costume de achar que responsabilidade só diz respeito ao que nós mesmos fazemos. Mas muito maior é a participação quando nos tomamos responsáveis por aquilo que não tem em nós a sua origem. Neste caso, comungamos com uma outra fonte. Neste caso, a responsabilidade é realmente livre e escolhida, não imposta pela natureza. É o caso de José. Por isso, Deus lhe confia sua “casa”, a plenitude da “casa de Davi” da 1ª leitura (2Sm 7,4-5ª.12-14ª.16).

Ora, este tipo de “paternidade responsável” – José comungando de um mistério que é maior do que ele – causa também surpresas. O evangelho de Jesus aos doze anos é um exemplo disso. O que é mistério, não nos pertence. O “Filho de Deus” não pertence a seus pais, mas estes pertencem a Deus. Esta realidade vale também na vida da família cristã (cf. S. Família/C). Ser transmissor de vida biológica é fácil. Ser transmissor de um presente de Deus à humanidade, como foi Jesus e como deveriam ser também nossos filhos, é difícil. Nós não temos a última palavra. Mas quem acredita acha bom isso, pois Deus é maior do que nós.

Na liturgia de hoje entra também o aspecto da fidelidade de Deus, realização de sua Promessa, no dom da vida de Jesus, desde sua concepção no seio virginal de Maria. A fidelidade de Deus encontra, em José, a fé do homem, como a encontrou já em Abraão e Davi. Fé e fidelidade têm a mesma raiz, completam-se. Não posso acreditar em quem não é fiel. Por outro lado, a fidelidade de Deus é a razão de minha fé. Por esta fé, José reconheceu o que aconteceu em Maria como realização da fidelidade de Deus e não como um desastre. A fé é o sentido que nos faz descobrir a obra da fidelidade de Deus.

UMA PESSOA JUSTA

Na festa de São José não convém deixar-nos desviar do essencial por especulações pseudocientíficas sobre sua paternidade, muito menos por conversas desrespeitosas. O que a Igreja quer celebrar é a participação de José na obra de Deus e a pessoa de José como “santo”, isto é, como pessoa que pertence a Deus.

Esse pertencer a Deus é que a Bíblia chama de “justiça”, e justiça, na Bíblia, significa, fundamentalmente, o plano de Deus, aquilo que é justo e certo por excelência. Pode até significar a justiça feita ao oprimido, sua vitória sobre o inimigo. Não é como nos nossos tribunais de justiça, onde um advogado esperto pode alegar um furo na lei ou uma lei contrária para transformar em justiça a pior falcatrua…

O ser humano é fundamentalmente justo quando insere suas ações na linha dessa justiça de Deus. É o que celebramos em São José. Diz o evangelho que “sendo justo”, José não quis despedir publicamente Maria, encontrada grávida sem seu saber, expondo-a assim à suspeição de adultério e à sanção mortal que a Lei previa para isso. Preferiu agir em segredo, sem alardear os juízos da sociedade. A justiça de José consiste em seu silêncio diante daquilo que ele desconhece, silêncio que se transforma no conhecimento do inimaginável mistério de Deus: o fruto no ventre de Maria é obra do poderoso Espírito de Deus. Daí: “Não tenhas receio de receber Maria, tua esposa” – pois ela era de direito esposa de José, ao qual, segundo os costumes de então, ela tinha sido desposada, prometida desde a infância. O cotidiano continua, Deus integra os andamentos familiares do casal de Nazaré em sua obra.

A justiça de José foi bastante diferente daquilo que a maioria dos homens em sua sociedade teriam feito. Prefigura a justiça que Jesus proclamará no Sermão da Montanha: “Se vossa justiça não for maior que a dos escribas e dos fariseus, não entrareis no Reino dos Céus” (Mt 5,20). Não é a justiça do escrupuloso cumpridor da letra da Lei, mas do homem piedoso, observador das pegadas de Deus na vida e no mundo e disposto a trilhá-las.

Que todos os que receberam o nome de José honrem esse nome.

 Texto do “Liturgia Dominical”, editado pela Editora Vozes.


Fonte: Franciscanos – Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil (OFM)

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